sábado, 9 de agosto de 2025

Faltava-lhe a cedilha

Leve cinco e pague seis!!!
Ele era comprador compulsivo e fanático por promoções, adorador de sextas-feiras negras. Um relâmpago que entrava, pegava, pagava e saía das grandes, pequenas e remediadas superfícies num abrir e fechar de olhos, sem sequer dar tempo a que as câmaras de vigilância lhe tomassem sentido. Morava em Fafe e estava no céu, rodeado de hipermercados por todos os lados. Ele acreditava que 13,99 são treze e não catorze euros. Se lhe aparecesse à frente "Leve cinco e pague seis!!!", letreiro jeitoso em vermelho e amarelo rematado por veementes pontos de exclamação, ele aproveitava logo...

Fui ao supermercado e comprei uma alheira. Como acontece tantas vezes a muito boa gente, trouxe para casa um dois-em-um: a alheira propriamente dita e um grandessíssimo barrete. E reclamei. Reclamei para o fabricante, reclamei para a cadeia de supermercados, reclamei até para o provedor do cliente do grupo económico dono da cadeia de supermercados. Todos me responderam, com mais ou menos demora e as tretas do costume.
O primeiro a bater com a mão no peito até foi o fabricante. Para além de um simpático pedido de desculpas, oferecia-se para me enviar uma nova alheira: imaginei que me mandaria pelo menos meia dúzia, todas elas de qualidade cinco estrelas, mas não aceitei. Eu só queria reclamar, porque reclamar é bom, alivia a azia, desopila. E eu já estava satisfeito.
Devo dizer que, regra geral, dou-me bem com os supermercados. Pela manhãzinha, logo após a abertura, aproveitando o fresco dos balcões frigoríficos. Em todo o caso - e a quem puder interessar, para futuras demandas, ou, quem sabe, até para fazer jurisprudência -, aqui deixo, humildemente, o teor da minha bem sucedida reclamação:

Exm.ºs Senhores,
Comprei ontem na loja do [...], em [...], uma alegada "Alheira de Caça" produzida por V. Ex.ªs e pomposamente apresentada como "produto seleccionado da Terra Fria Transmontana".
A etiqueta prometia uma alheira com, nomeadamente, 40% de carne de caça (pato, perdiz e coelho), 30% de carne de porco e 20% de pão trigo.
Cozinhada e aberta, verifiquei logo, sem precisar de ir ao microscópio, que fora enganado. Carne... de grilo! Assim a olho - e comprovado na boca! -, a alheira era afinal composta por 90% de pão e 10% de gorduras diversas.
Dito de outra forma: a alheira de caça de V. Ex.ªs não trazia cedilha.
Melhores cumprimentos,
h.

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