As massas
Ele gostava de uma boa massa à lavrador, de uma boa massa de marisco e sobretudo de uma boa massa de bacalhau. Também concordava com a vacinação em massa. Quanto à massa de ar quente, não é que desgostasse, mas afligia-o a flatulência.
Fiquei muito feliz quando, em 2013, a nossa dieta mediterrânica ganhou a medalha de Património Cultural Imaterial da Humanidade. O que eu gosto mais na nossa dieta mediterrânica, para além da comida propriamente dita, é do facto de se chamar dieta, o que me sossega sobremaneira a consciência, embora me faça bastante mal ao resto. Mas é dieta e temos de obedecer. Uma dieta feita, paradigmaticamente, à base de umas tripinhas com tudo, de uma vitelinha assada à moda de Fafe, de um bacalhauzinho na brasa, de um cabritinho no forno a lenha, de uns ossinhos da suã entalados entre salpicão caseiro e moiras encantadas e um naco de orelheira para desenfastiar e duas ou três costelinhas e meia dúzia de fatias de toucinho com o sal no ponto e batatas cozidas sabendo a terra e olhos de couves geadas pela madrugada e feijão vermelho da leira ao lado e, por cima desta riqueza, alho picado e azeite da fartura e do melhor, mais um tintinho honesto e de malga para molhar a palavra. Dieta cumprida, partilhada, sempre que possível, nas origens, no sítio das coisas, com porco da matança, nos velhos tascos ou antigas vendas das nossas aldeias, de Regadas a Aboim, de Fareja a Moreira de Rei, na cozinha escura, à roda da lareira de chão. Produtos frescos, locais e produzidos em sintonia com os ciclos astrais e os ritmos da natureza, como muito bem preconiza a Unesco. E eu, nestas coisas, respeito implacavelmente a Unesco.
Depois, gosto também da denominação ela própria. Património Cultural Imaterial da Humanidade. Gosto da pomposidade das maiúsculas e gosto da palavra "Imaterial", porque, pensando bem, é uma palavra que, não sendo sólida nem líquida, resvala sorrateiramente para o domínio do "Gasoso" - o que, como todos sabemos, confere...
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