quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

O Rates vendia ratoeiras

A montanha pariu um rato. Que miséria, realmente. Se ainda ao menos parisse um elefante! Ou dois - que incomodam muito mais...

O Rates vendia ratoeiras para ratos. Também vendia armadilhas para pardais e toupeiras. E chumbos para espingardas de pressão. E fisgas. E vendia foguetes, rabichas, estalinhos, caretas de Carnaval, calçadeiras, fio do Norte, lixa, colchetes, gaiolas para grilos e furões, anzóis e sedielas, chapéus de palha, palha de aço fina e grossa, sandálias de plástico, socos, galochas, velas, DDT, solarine, vassouras, lousas e lápis de ardósia, coadores, funis, navalhas, agulhas para desentupir máquinas a petróleo, peidos-engarrafados, garrafões e pelo menos um exemplar de todas as bugigangas e quinquilharias alguma vez inventadas no mundo inteiro, com ou sem serventia, tudo aparentemente ao monte porém segundo uma ordem que ele lá sabia, mas eu, na minha ideia de miúdo, achava era um piadão àquilo de o Rates vender ratoeiras para ratos. Para além disso, o Rates vendia rolhas. E já sabem: as palavras sempre me interessaram muito, e essa mania tola, que eu tanto estimo, felizmente não me larga - o Rates roeu a rolha da garrafa do rei da Rússia...
Rates era o proprietário mas também o sítio, lojinha de uma porta só, minúscula, escura, esconsa, tipo vão de escada. O dono servia à pinta, vestia uma bata de sarja cinzenta, barriguda como ele, e usava óculos na testa e manguitos negros. O Rates era uma verdadeira instituição fafense, ali à beira de outras duas não menos notáveis instituições fafenses, o Marinho e o Miranda das famosas pataniscas, memórias infelizmente perdidas, parece que esquecidas de propósito, por vergonha, numa praça nova e consta que muito concorrida derivado à Justiça de Fafe e às vezes aos Correios.

Mas vergonha de quê, ó gente da minha terra? Devíamos era ter orgulho do nosso passado tasqueiro e similar. Fafe daquele tempo era muito avançado, não penseis o contrário. Era até muito à frente, tomara Fafe de agora! Reparai que, com mais de cinquenta anos de avanço em relação à guerra de sexos e de géneros que aí vai e à disfunção gramatical entre masculinos e femininos e assim-assim que nos arrelia as meninges, nós já praticávamos a solução redentora e neutral hoje em dia advogada pelas mentes brilhantes do politicamente correcto. Nem ratos nem ratas. Rates é que era! Rates, e tínhamos pelos menos dois: o das ratoeiras propriamente dito e o da bola, que era outro espectáculo!...

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